Pesquisadores alertam para perda de biodiversidade e redução drástica na capacidade de retenção de carbono
As queimadas recorrentes na Amazônia estão provocando uma transformação profunda no bioma. Estudos conduzidos por pesquisadores brasileiros revelam que áreas frequentemente atingidas pelo fogo estão se tornando florestas secundárias, mais pobres em biodiversidade e com uma drástica redução no estoque de carbono. Segundo os cientistas, as florestas impactadas podem perder até 68% da sua capacidade de armazenar dióxido de carbono (CO₂), agravando os efeitos das mudanças climáticas.
“Estamos observando um processo de secundarização da floresta. Ela não está se transformando em savana, mas em uma versão empobrecida de si mesma, com menos carbono estocado e menos diversidade de espécies”, explica Fernando Elias, pesquisador da Universidade Federal Rural da Amazônia.
Declínio das Espécies Florestais
O estudo, realizado em áreas de transição entre a Amazônia e o Cerrado, comparou florestas nunca queimadas, queimadas uma vez e queimadas várias vezes. Os resultados mostram que, enquanto espécies típicas do Cerrado e generalistas permanecem estáveis, as espécies florestais – mais sensíveis ao fogo – estão em declínio.
“A vulnerabilidade de algumas árvores é impressionante. Muitas espécies florestais têm cascas finas ou inexistentes, o que as torna extremamente suscetíveis ao fogo. Quando uma floresta com essas características é queimada, essas espécies podem desaparecer completamente daquele local”, alerta Elias.
Impacto no Clima e nos Serviços Ecossistêmicos
Além de ameaçar a biodiversidade, o empobrecimento das florestas compromete serviços ecossistêmicos cruciais, como a regulação das chuvas, o sequestro de carbono e a polinização. De acordo com os pesquisadores, as queimadas reduzem drasticamente o estoque de carbono na vegetação: florestas intactas armazenam em média 25,5 toneladas de carbono por hectare, enquanto áreas queimadas várias vezes retêm apenas 8 toneladas.
“Cada queimada não só emite gases de efeito estufa como também libera o carbono armazenado nas árvores. Isso intensifica as mudanças climáticas e reduz a capacidade da floresta de atuar como um sumidouro de carbono”, afirma o pesquisador.
Ameaças no Arco do Desmatamento
As áreas analisadas, localizadas entre Amazonas, Pará e Mato Grosso, integram o chamado Arco do Desmatamento, uma região especialmente vulnerável devido à atividade agropecuária e às condições climáticas mais secas. O avanço das mudanças climáticas torna essas florestas ainda mais suscetíveis ao fogo, criando um ciclo de degradação contínuo.
“As florestas dessa região, muitas vezes tratadas como Cerrado, possuem elevado estoque de carbono e abrigam espécies típicas da Amazônia. No entanto, o Código Florestal permite o desmatamento de até 80% das áreas classificadas como Cerrado, o que coloca essas florestas em risco adicional”, destaca Elias.
Parcerias para a Ciência
O estudo, financiado pelo Instituto Serrapilheira, contou com a colaboração de instituições nacionais e internacionais, como a Universidade Estadual do Mato Grosso e a Universidade de Exeter, no Reino Unido. Desde 2017, o Serrapilheira já investiu mais de R$ 90 milhões em projetos científicos, buscando fortalecer a pesquisa no Brasil e promover o conhecimento sobre temas urgentes como o impacto das queimadas na Amazônia.
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